Nesta segunda-feira (16) foi apresentado e debatido na Câmara de Vereadores de Florianópolis o polêmico Projeto de Lei 17.484/2018, que cria o Programa Creche e Saúde Já da prefeitura. Na terça-feira (17) a aprovação do caráter de urgência (e que rapidez!) ocorreu sobre os protestos de milhares de profissionais, servidores, estudantes e representantes de associações, conselhos, e da própria sociedade civil. Os trabalhadores da Prefeitura Municipal de Florianópolis (PMF) estão em greve desde o dia 11 de abril.
Segundo o professor Douglas F. Kovaleski (reportagem na íntegra aqui) “a prefeitura de Florianópolis, por meio do seu mandatário maior, senhor Gean Loureiro e o Secretário da Saúde Carlos Alberto Justo da Silva (Paraná), não tem medido esforços para introduzir as Organizações Sociais (OS) como gestoras da saúde no município. A decisão de passar a gestão da saúde para OS é um suposto remédio para uma legislação federal que não altera a realidade do gasto público, apenas desmonta o serviço público” afirma Douglas.
Quanto à possível eficiência das OS, um levantamento realizado por professores da UFSC (acesse o documento na íntegra aqui) indica que “O estudo utilizado para justificar a proposta de PL se baseia no Relatório técnico produzido pelo Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, que faz uma análise comparativa da gestão hospitalar por Organização Social e Pública, por se tratar de estudo técnico, não utiliza a metodologia cientifica que assegura características semelhantes para permitir comparações, portanto passível de vieses de interpretação de seus resultados”. Além disso, os professores chamam atenção para o fato de que “em relação a eficiência do HEMOSC/CEPON, [tão propagada nos discursos em defesa do PL] cabe destacar a participação financeira do setor público em itens onerosos na gestão administrativa. No portal de transparência, no período de janeiro 2017 até a presente data, o Fundo Estadual de Saúde movimentou R$1.567.218.613,28, dos quais R$ 802.879.058,30 foram pagos a Fundação de Amparo ao HEMOSC/CEPON para manutenção de unidades, ampliação de infraestrutura, ações na área da saúde, construção de centro cirúrgico. Isto significa que 51,30% do investimento total do Fundo Estadual de Saúde foi investido nesta organização. Não se observou no relatório do tribunal de contas a inclusão desta importante informação”. Neste sentido, o professor Douglas reafirma “Afinal, qual é a diferença de pagar funcionários via administração pública direta ou via OS? O resultado é a privatização do setor público, que passa a ter a contratação, bem como toda a gestão de pessoal feita por uma instituição de direito privado”.
O que se tem visto no Brasil (e no mundo!) é a constante perda de direitos constitucionais, um destes direitos que tem sido negado (e dos mais preocupantes) é o direito à democracia. A democracia brasileira – ainda que representativa, prevê a participação popular em diferentes dimensões, uma delas se refere ao direito ao voto (que já merece discussões quanto a sua qualidade democrática), outra instância da participação social prevista no Brasil são os Conselhos Municipais de Saúde (CMS) e que, no caso do PL 17.484/2018, foi um espaço totalmente ignorado pela PMF.
De acordo com Carta Aberta à População de Florianópolis (acesse aqui) lançada pelos conselheiros municipais de saúde da cidade “o Projeto de Lei encaminhado à Câmara de Vereadores nunca foi debatido no CMS, muito menos incluído em qualquer plano de saúde deste Município”, os conselheiros reafirmam a importância do CMS enquanto uma “instância deliberativa, conforme a Lei Federal n. 8142/1990, dentro do Sistema Único de Saúde, ou seja, é órgão de fiscalização e deliberação sobre a política de saúde a ser instituída no Município, principalmente quando se trata de mudança de modelo de gestão, contratação de serviços e terceirização”. O CMS de Florianópolis, assim como o Conselho Municipal de Educação se posicionaram contra a aprovação do PL 17.484/2018.
“É por isso que os movimentos sociais e as pessoas preocupadas com o bem-estar dos habitantes de Florianópolis precisam se mobilizar imediatamente para politizar esse debate, esclarecer a população, desmascarar os interesses da atual gestão municipal e manter o SUS do município uma referência nacional e internacional” afirma Douglas.
Com objetivo de apoiar o movimento deflagrado pelos trabalhadores municipais e demonstrar seu descontentamento com a forma com que os fatos têm sido conduzidos por muitos dos chamados ‘representantes’ do povo, os professores e estudantes do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina lançaram nesta manhã de quinta-feira (19) uma Moção de repúdio ao PL 17.484/2018 (ver moção na íntegra aqui). A moção questiona o “discurso ameaçador da perda de serviços essenciais, a Prefeitura Municipal de Florianópolis tenta convencer o cidadão sobre a pertinência da alternativa que esta lhe apresenta, qual seja: a retirada do Estado e o gerenciamento do serviço por uma organização social privada” (veja a propaganda veiculada em nome da PMF aqui). Professores e estudantes afirmam que “O modelo proposto não é novo, já foi bastante experimentado e não se caracterizou pela eficiência, nem pela eficácia. Pelo contrário, existem várias demonstrações de má gestão, má utilização e desvios de recursos, precarização da relação trabalhista”.
Diante do exposto o Núcleo de Pesquisa em Bioética e Saúde Coletiva da UFSC (NUPEBISC) concorda com a posição do Centro de Saúde da UFSC, de que “esta situação furta a sociedade da participação, do controle social e da subordinação das políticas de saúde, demonstrando claramente o interesse na privatização dos serviços públicos, em especial na saúde e na educação”, e portanto os membros do NUPEBISC expressam seu total apoio aos movimentos que resistem ao PL 17.484/2018. Estimulamos a sociedade civil a fazer uso de seu direito democrático de luta e se unirem às manifestações pacíficas quem vem acontecendo frente à Câmara de Vereados, em especial a que ocorrerá nesta sexta-feira (20) as 16:00h, momento em que ocorrerá a votação para possível aprovação deste controverso Projeto. Até lá, convidamos nossos concidadãos a mostrarem seu descontentamento aos nossos ‘representantes’ políticos escrevendo um e-mail ou mensagem de telefone aos vereadores de Florianópolis (Acesse a lista de e-mail aqui).
NUPEBISC na luta pela democracia!